segunda-feira, 29 de dezembro de 2014




De Janeiro a Dezembro
muitos chegaram e partiram...
Um tanto de mim se desperdiçou
um tanto silenciou.
O peso da balança em constante movimento
ora alegrias, ora tormentos.
De janeiro a Dezembro
nada fica
nada se eterniza
apenas os ciclos são precisos...


P.S. Na foto, um ciclo que se foi  - adolescência com Ricardo e Flávia...

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Me deparo com o significado da palavra Sucesso, no dicionário: "Significa ter êxito em alguma coisa; Ter um resultado feliz em algo; Conseguir chegar ao fim de uma empreitada". Começo a divagar na história de duas amigas, muito seguras de si, por toda a vida... Intelectualíssimas! Uma virou executiva de uma multinacional e a outra, professora universitária. Estamos distantes. Sempre as acompanho em fotografias pelas redes sociais. Uma é presença marcante em reuniões de cúpula e a outra, já morou em vários lugares, nos mergulhos que tem lhe proporcionado a vida acadêmica. Vive fotografando as suas viagens pelo globo. Aquela casou, teve filhos, aparece em cliques de jantares de negócios, mas me parece muito mais preocupada e envelhecida. A outra acabou de ter um filhinho e me parece bem mais jovial (na verdade, parece que o tempo é seu aliado) e leve! Pergunto a algumas pessoas mais próximas pelo destino das duas e a maioria enaltece a vida da primeira. E aí o significado de sucesso vai se entrelaçando na história dessas duas pessoas. O conceito de sucesso é quase sempre traduzido ao "quanto" se juntou em somas monetárias. O desejo da piscina do Tio Patinhas, repleta de moedas, embora ele sozinho e avarento, esteja trancado em sua caixa forte, sem usufruir das suas pratas. Sucesso é acúmulo de riquezas materiais, ainda que a custa da própria vida, que se desperdiça e se esvai... Para alguns, eu, que troquei a capital confusa, mas, "a capital", por uma cidadezinha às portas do oeste da Bahia, assinei a minha inversão na rota do sucesso. E eu de cá, observando as engrenagens da máquina da qual fui parte, me sinto tão bem sucedida nessa troca... De uma vez por todas, fico com a leveza da minha segunda amiga...

domingo, 23 de novembro de 2014

Hoje estou sofrendo de saudade… de tentar aprender a letra de uma música e passar horas tentando compreender a cabeça do autor, em uma palavrinha que me intrigou. De reler Cem Anos de Solidão, sem pressa para virar a próxima página. De ficar horas a fio olhando nos olhos do meu amor, repetindo histórias que vivemos e que ficaram esquecidas pelos cantos. De tomar um café com a minha mãe, deixando a tarde andar, sem pressa. De narrar histórias para os pequeninos da família, imitando a voz dos personagens e fantasiando junto com eles. Hoje, eu quero as pessoas que eu já não vejo, as falas que eu já não ouço. Hoje, eu quero também o ócio… Hoje, estou sofrendo de saudades de mim mesma…
                                        (Tâmara Rossene)

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Compartilhando por aqui, meu texto premiado com o segundo lugar, na categoria Prosa, do I Concurso Literário do Servidor Público do estado da Bahia.

                                      Vestido de Noiva

Era uma tarde de quarta-feira, mês de maio. Final das águas de março, que retardavam sua ida nos chuviscos repentinos. No corre-corre dos camelôs para salvar as mercadorias e dos passos miúdos de colegiais com livros encostados ao peito, como para proteger as lições dos pingos que iam se encorpando, lá estava ela!  Indiferente aos gritos, tropeços e aos imprevistos provocados pela chuva. Pedra no caminho dos que tentavam a muita custa não se molhar.
Detinha-se Maria em frente as vitrines. E assim ficava horas. Do outro lado, ostentava-se o objeto de admiração, para o qual convergiam todos os seus sentidos, a esquecer do mundo a sua volta, e a provocar mudanças de rota, para as pessoas que, no corre-corre do comércio, se deparavam com aquela estátua humana em seu caminho, imóvel, a fitar vitrines. Lá estava ele! O vestido de noiva! E Maria ficava a degustar aquela visão perturbadora, quebrada apenas pelos berros da filha : Vamos, mamãe!
As filhas... Sonhava Maria com o momento, em que o vestido não flutuaria mais sozinho, como em tantos outros sonhos, mas em que ele se colaria ao corpo de suas filhas, para serem arrancados apenas pelos noivos, na noite de núpcias. E suas filhas, pensava, eram suas esperanças. E Maria lembrava, do seu próprio casamento, escondido dos pais, em uma outra cidade, naquela capela encravada na gruta; ponto turístico e local de encontro de romeiros. Mas, de desencontros dos desejos mais íntimos de Maria. Dele e de muitas mulheres: o véu, a música, os passos miúdos, os cochichos entre os convidados, os olhares para a noiva. No seu casamento, apenas ela, o namorado (ou noivo?), as testemunhas e os gestos e palavras mecanizadas do padre. Pelo menos era assim que ficara eternizado aquele momento, em sua memória. Apesar do marido, efusivo, lembrar que o sol estava se pondo e que os raios dourados adornavam seu cabelo. Que o céu e o dia estavam muito azuis, que as andorinhas se multiplicaram e que mensagens de boas novas pareciam surgir dos quatro cantos. Na estrada de chão, na gruta da Lapa, no canto e na prece dos romeiros, nas crianças que cruzavam o seu caminho...
E assim cresceram suas duas filhas, sem saber que eram acalentadas por aquele secreto desejo, apesar de sentirem que alguma coisa estranha acontecia com a  mãe, quando se deparavam com aquelas vitrines, tão ornamentadas nos meses de maio. E foi em maio que nasceu Maria. Nem no começo, nem no fim, mas exatamente no meio do mês das noivas. Como uma premonição, uma promessa, uma escolhida. Se chamava Maria, nascera em maio e se casara em uma gruta. E por que então o destino lhe negara, um direito que a natureza lhe concedera?
Uma das filhas de Maria, preferiu um desses casamentos modernos, em que se acreditava mais na força da palavra, do que nos papéis do cartório e no “Marido e Mulher” do padre. Agora só restava a outra filha. Ou não restava, porque esta, já grávida e enjoada de tanta badalação, preferiu se acotovelar nos corredores do fórum, e se casar apenas no civil. Ou talvez nem tivesse preferido, mas optado pelo caminho mais prático e econômico, de regularizar a situação, antes da visita da cegonha.
E andava Maria pelos cantos, triste, abatida e sem que ninguém percebesse... desiludida! Duas oportunidades perdidas, onde foi que errara? E só encontrava consolo nas vitrines, tão suas conhecidas. Mudou de religião e de atitudes, procurando um consolo prá’s suas mágoas. E vista assim, de joelhos no chão e oração fervorosa, parecia uma devota de Santo Antonio, pedindo casamento.
      A primeira filha se separou e no meio da confusão, Maria enterrou o sonho acalentado. E a filha arrumou namorado, vistoso, falante e com ataques de reparador aos erros passados da namorada. Ganhou o apoio da sogra, que procurou encaixá-lo nos moldes do genro que sonhara, e que não tivera até então, pois nunca aprovara a escolha das filhas. E ele, ao que parece, se encheu de entusiasmo com toda aquela adoração e anunciou o casamento.
E adiantou-se Maria, a consultar moldes e costureiras, e a encomendar flores e salgados, como se a festa, fosse homenagear ela própria. Alguns duvidavam: - Aquela é a Maria? Não, era outra! O seu rosto adquirira uma tonalidade brilhante! Orava com mais fervor, comandava a casa e sorria sem parar! Apenas um pouco nervosa, como riem as noivas de maio, temerosas com a proximidade do grande dia. Mas não perdeu um único detalhe da festa, nem do vestido, que acompanhou molde a molde na costureira, sentindo no próprio corpo os alfinetes dos ajustes, que espetavam o corpo da filha.
E chegou o dia! Maria no primeiro banco da Igreja de Nossa Senhora da Guia, com os óculos que nunca usava em público, excetuando-se aquele dia, em que precisava ver bem o que conseguira a custa de tanta espera. E quando finalmente entrou a noiva, era como se Maria tivesse se transportado para o corpo trêmulo de sua filha e eram as suas mãos que se entregavam nas mãos do noivo. E era ela quem ansiava por uma vida nova, apesar de já ter perdido uma boa parte das expectativas em seu casamento. E junto com o “Sim” da sua filha, Maria balbuciou a mesma palavra, em estado de êxtase. Olhava firme para cada convidado, deleitava-se com a música, embriagava-se com cada expressão, cada gesto, sentido o ramalhete de flores em suas mãos, apesar dele estar seguro nas mãos da noiva. E como em um milagre Maria se transportou de véu e grinalda prá gruta da Lapa. E viu os raios de sol e os sinais de que lhe falara o marido todos esses anos. De novo, era a noiva daquela tarde e de muitas tardes, olhando os vestidos. Mas naquele momento encontrara o seu.
Quando a cerimônia terminou, Maria suspirou profundamente e não chorou como costumam fazer as mães, nessas ocasiões. E seus olhos vertiam lágrimas por tão pouco! Mas deu um sorriso inigualável para o marido ao lado, o maior e talvez mais bonito, de todo aquele tempo em que estiveram juntos. O marido, por um momento, acreditou estar vendo a mesma noiva que tomara em suas mãos, em uma certa tarde, em uma gruta distante. Seu rosto se iluminou por um instante, mas ainda assim, não compreendeu. Êta Maria cheia de mistérios! Pensou. E não deixou de tomá-la nas mãos como o fazem os noivos.

Nem todo mundo notou a aura de encantamento que rondava Maria naquele dia, mas misteriosamente, foram percebendo, que desde então, nunca mais voltou a olhar vitrines.    

Tâmara Rossene

sexta-feira, 31 de outubro de 2014



Como acabamos de passar pelo Dia Nacional do Livro, lembro que a minha mãe me contava histórias antes do sono chegar. Quando cansava dos livros que lia prá mim, inventava personagens incríveis, que povoavam os meus sonhos, pela madrugada. O meu pai trazia pilhas de livros prá casa e nos finais de semana, vivia com os olhos ávidos, percorrendo alguns deles. E trazia para o nosso meio, dezenas de personagens. Saía de um herói bíblico prá um Deus da Grécia Antiga, numa facilidade tamanha. Dizia que os livros eram a única riqueza que nos deixaria. De vez em quando, eu me deparo com Casa Grande e Senzala, Menino de Engenho, com romances, personagens e filósofos que me olham como se estivessem em outra época... os livros que ele me deixou! Muito cedo, eu me enveredei por Reinações de Narizinho. E por muitas vezes meus dedos procuraram os livros que me proibiam, porque não se adequavam a minha idade. Assim foi com os Miseráveis e com Bocage. A minha imaginação pulsando... Uma receitinha simples, nesse mundo cheio de aparatos tecnológicos. Mais tarde, na Faculdade de Economia, eu me debruçava por horas, sobre os grossos volumes, ora copiando, ora atrás das tais fotocópias. Agora, o acesso tão facilitado! Mas fico aqui pensando, que em meio a tanta informação, há tanto esvaziamento de conteúdo! Tanta reprodução, sem aprofundar-se... Como se desse universo inteiro a explorar, de repente, se instaurasse o caos...

P.S. Na foto, João Marcelo, ainda muito pequenino, impressionado com uma livraria.

segunda-feira, 20 de outubro de 2014






Sozinha na cidade
entre caminhos confusos
e sentimentos conflitantes
atrás do andar intenso 
de quem precisa chegar a qualquer custo.
Enquanto eu
ando sem pressa
escolhendo um dos infinitos rumos.
Eu-rizoma
traçando conexões
combinações binárias
pontos convergentes.
Embora todos eles retornem a um único ponto:
Eu e a cidade
unidas pela solidão.

(Tâmara Rossene)

P.S. Na foto, Mariana, na Ponta de Humaitá, clicada por mim.

domingo, 5 de outubro de 2014



Daqui a cem anos
meu sorriso ironico não penetrará mais em teus ouvidos
ninguém mais escutará meu grito
a minha voz já terá se dissolvido
e o meu clamor emudecido
não fará mais eco 
nem chegará aos meus inimigos
todos silenciados em algum jazigo.
O salto dos meus sapatos carcomidos
não insultará mais as pedras da avenida
e eu restarei esquecida...
A única nesga de esperança
é que quando meus rastros se diluírem em pó
e quando meus restos não forem nem mais alegres
nem tristes
a palavra me eternize...

                   (Tâmara Rossene)

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Abandonei o café e a pressa para assistir as cenas da reintegração de posse de um prédio antigo, no centro de São Paulo. As imagens dos policiais armados por detrás dos escudos, a princípio me sugeriram uma guerra e eu esperei ansiosamente pelas armas dos que estariam do outro lado. De repente começaram a atirar colchões, panelas e outros utensílios domésticos. Não conseguia ouvir a voz da repórter, não sei se inconscientemente ou se de forma proposital, para não me contaminar com o oportunismo. Mas junto com a voz incessante que anunciava o ineditismo das imagens, acho que devo ter ouvido algo, porque fiquei esperando os bárbaros se atirarem sobre a Polícia. Ao invés deles, uma mulher saindo com uma criança nos braços. A câmera volta para as bombas de gás lacrimogênio. A cena da criança chorando nos braços da mãe foi abandonada e eu do lado de cá, querendo notícias.  Por ironia, a Constituição Federal encostada na estante a minha frente. Lembro do trecho "a propriedade cumprirá a sua função social", quase ao mesmo tempo em que ouço que o prédio está abandonado há dez anos. Tentei imaginar a ocupação do lugar, as caixas de papelão servindo de armários, os colchões depositados sobre o assoalho e a sensação de estar em casa! Aí muitos me dirão, que há aproveitadores infiltrados, que há manipulação e interesses escusos. E me contarão histórias de pessoas que superaram as adversidades e que sairam da condição de miséria, como se fosse essa uma regra geral. Como se a meritocracia pudesse alcançar a todos. Passei a manhã pensando no Princípio da Proporcionalidade e na voz da repórter informando que a Prefeitura reservou lugares em um depósito e no CRAS, mas os ocupantes se negaram. Novamente as caixas de papelão me vem a mente, a porta abrindo e fechando e eu me perguntando: E a sensação de estar em casa? Achei desproporcional. Lembrei de um trecho de Milton Santos, quando ele afirma que "o espaço tem muito de parecido com o mercado". E depois diz que "mercado e espaço, forças modeladoras da sociedade como um todo, são conjuntos de pontos que asseguram e enquadram diferenciações desigualizadoras". O mercado e o espaço ditando nossos martírios cotidianos, legitimando guerras entre desiguais. E a gente proclamando o mérito, como se ele pudesse salvar a todos. Novamente Milton Santos povoando meus pensamentos, tortuosos para muitos... "Cada homem vale pelo lugar onde está".

P.S. Para amenizar, uma foto tirada por Aline Amorim, da roda gigante que agora ocupa o espaço do calcadão da Barra, com o prédio do Oceania atrás. Muitos, que circulam na roda gigante, olham para o prédio, como um objeto de desejo...


sábado, 13 de setembro de 2014

No meu retorno a Ibotirama, em 2005, ainda insegura com o processo de regresso e ansiosa pela mudança, eis que surge Rita em meu caminho, a princípio para me ajudar com as tarefas da casa. Mas depois passou a ser como um braço direito, que me socorreu por incontáveis vezes. Acompanhando de tão perto a sua luta para criar os filhos e vendo-a exercendo esse papel com tamanha dignidade e honradez, me sinto ínfima, quando são direcionados elogios a mim. Eu, que fui agraciada com tantas oportunidades, jamais poderia me sentir confortável, pensando nos meus próprios méritos, quando penso em pessoas como ela, que apesar dos direitos que lhe foram negados, contrariam as estimativas que as circunstâncias ditam. Ela certamente é muito maior do que eu e do que muitos que estão a minha volta, que tiveram estrutura familiar e um caminho apontado. E hoje eu estive assim, por algumas horas em frente a sua casa no bairro São João, feliz por celebrarmos mais um ano de vida que lhe chega, por termos nos tornado comadres e por ter exemplos como o dela, tirando a venda dos meus olhos e me mostrando de que tamanho eu realmente sou...

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

SEM FILTRO, SEM MAKE, SEM MÁSCARAS!

Pois é, embora ninguém tivesse me desafiado, como é a última moda das redes sociais, e embora eu esqueça muitas vezes do filtro e esteja quase sempre sem maquiagem, cá estou eu... Disposta a retirar os disfarces, porque só assim estarei em minha inteireza.  E quando as máscaras caem, eu não sou tão tolerante quanto pareço e não tenho vontade de dar bom dia para todos aqueles que cruzam o meu caminho. Sou completamente avessa as formalidades e a burocracia que cercam o meu cotidiano. Tenho paciência para ouvir, mas confesso que ás vezes me perco no diálogo e fico me perguntando lá dentro, porque a história não se desenrola de outra forma, ou porque nunca termina. Sou péssima para gravar rostos e nomes, mas não por desinteresse, e sim por uma dificuldade da memória, que já me colocou em sérios apuros. Mas gravo os enredos.  Perdôo mil vezes até, mas tem algumas mágoas das quais não consigo me desvincular. E para os autores delas, o pior sentimento que posso oferecer é a indiferença. A indefença pelo outro dentro de mim, significa a morte. Já chorei tanto, que hoje tenho dificuldade de verter lágrimas. Não gosto de barulho por nada. Não tolero discussões acaloradas. Não suporto que associem a minha fé, a falta de frequência nos templos religiosos. Tenho um espírito livre e uma alma feliz. Ás vezes acho que tenho tanto, que tenho vontade de chorar (e choro) pela dor alheia. Mas ás vezes sou cruel e sinto alívio quando vejo o outro reconhecendo e sentindo a dor, pelo erro cometido. Tenho vontade de usar roupas das décadas de 60 e 70, mas me rendo ao julgamento alheio, e me sinto covarde por isso. De igual modo, às vezes me sinto covarde por não me importar com o julgamento do outro. Tenho uma alegria que se expande. Mas gosto muito de solidão. Tem dias que sou extremamente melancólica, como se isso fosse uma legado, que me perseguisse. Não gosto de televisão, mas posso passar horas, assistindo a um filme meloso e sem sentido, só porque a música ou a fotografia me tocaram. Gosto de contemplar e me culpo quando me permito estar no ócio. Acho que sou uma incógnita para mim mesma, ainda que sem nenhuma maquiagem ou máscaras para camuflar...

terça-feira, 2 de setembro de 2014

E de repente, o meu filho em uma fração de segundos, sem que eu me descuidasse, se atira no portão eletrônico e prende o pezinho. Não consigo soltá-lo, perco o chão e grito socorro desesperadamente. E na mesma fração de segundos, meus vizinhos surgem do nada e empurram o portão prá longe! Ficou um arranhão apenas! Ah, mas o sentimento da fragilidade daquele menininho ali a minha frente e do meu tamanhinho frente aos acasos é uma cicatriz que atravessa a minh'alma... De repente, a consciência da minha impotência! E a dor do meu amor!


P.S. Na foto, Mariana lendo prá João Marcelo na Biblioteca dos Barris...

sábado, 30 de agosto de 2014



A memória olfativa me desconcentrando... Cheiro de sabonete Francis me lembra a mudança pra Barreiras, aos quatro anos, a dor de uma vacina e o banho reconfortante de minha mãe. Quando eu vinha de Salvador para Ibotirama passar as férias e meus pais chegavam muitos dias mais tarde, para passar o Natal, eu era acordada com o aroma das maças, embrulhadas em papel lilás, que saltavam de dentro das malas. Cheiro de beiju e de escaldado de leite, lembra a minha avó Anália me rodeando. Perfume de Leite de Rosas, ao gesto de minha mãe, ao cair da noite, limpando a pele do rosto, com o frasco cor de rosa nas mãos. Cheiro de vinho, aos almoços de domingo, com o meu pai elogiando a sua Ricardina e nos arrancando sorrisos. Cheiro de Pimenta me lembra a comilança na gamela, junto com Orla e Cristina e aos meus gritos, devido a ardência. Alfazema me leva aos meus pequenos, em seus primeiros dias, aconchegados junto ao meu peito. E aí vou eu, com o aroma de uma colônia, do café fumegando em tardes infindas, de uma fruta da época, da terra molhada, espalhando o cheiro da chuva, do cheiro do pote de barro... Meu olfato viajando pelo tempo, misturando sensações, me trazendo pessoas, lugares. Numa trilha de aromas, minha história se desenrolando...

segunda-feira, 11 de agosto de 2014



E embora o meu pão de cada dia
passe pela burocracia
pelos arroubos de hipocrisia
pelos olhos que me vigiam
e que fecham as janelas.
Embora sejam velhas idéias
papéis e horários a cumprir.
Embora seja uma constante vontade
de fugir
o que me salva é o que me tira o sono
o que me invade:
Minha alma
é a arte!

(Vivi Éssi a frente e eu, atrás, na beira do Velho Chico).

quinta-feira, 7 de agosto de 2014


Os ventos de agosto começaram a soprar sobre nós! Vento e poeira sobre as casas, levantando as roupas dos varais, jogando terra sobre os telhados, sacudindo minha cabeleira. Ontem vi um redemoinho invadindo a cidade quando passava na BR. A ventania de agosto, antes que o calor nos sufoque, quando entrar setembro. Quando chego em casa nessa época, no finalzinho da tarde, vejo a amendoeira da porta da minha casa assim, folhas secas sacudindo, abandonando os galhos, para desespero das minhas vizinhas que vivem de vassoura em punho, para afastá-las. Até elas fazem parte desse cenário e não sabem! O cenário de agosto. Agosto pairando e minha amendoeira bailando, ao sabor dos ventos....

P.S. Obrigada, minha Mariana Bomfim, que me mostrou o encanto das folhas caindo...

sábado, 2 de agosto de 2014


Fico aqui observando essa onda de selfies inundando as redes sociais e embora eu nada entenda de pintura, fiquei aqui pensando em Frida Kahlo e nos tantos auto-retratos que pintou. E na forma como se desnudava nas pinturas, não se auto retratando por vaidade ou por se julgar o modelo perfeito. Mas os pincéis eram reveladores. A paralisia que a tomou quando criança e o acidente de trem alguns anos mais tarde, a incapacidade de gerar filhos, o relacionamento complicado...Fico aqui pensando que a dor retratada nas telas, ora era física, ora na alma. Uma excentricidade na aparência, que por vezes acredito ter sido por fuga. Numa tela, me aparece no colete que lhe aprisionou o corpo, mas não me sugere fragilidade. E volto aos selfies do agora. Haverá em algum deles essa intenção? De mostrar através da imagem algo além do que visualizamos? Do físico revelar o que está implícito? Ou são totalmente esvaziadas de qualquer conteúdo? Será que há algo a mais do que vemos e supomos? Ou,tanto tempo em auto retratar-se em vão?

P.S. Na imagem, Frida Kahlo...

quarta-feira, 30 de julho de 2014


E lá está! 
como se fosse centelha 
nossa casa
vermelha! 
Labaredas do quão intenso guardamos. 
Meus meninos 
teus queixumes 
nosso riso 
nossos planos. 
Um quarteto. 
Até a exaustão
argumentos 
nossos maiores medos. 
Tudo tão nosso e tão guardado 
desejos de nos trancafiar sempre ali 
o ninho que criamos 
nossa caixinha rubi...
                
                   Tâmara Rossene

sábado, 19 de julho de 2014


Me chamou a atenção uma reportagem sobre imigrantes ilegais que saem da Guatemala, Honduras, El Salvador, para os Estados Unidos. A tentativa de pular o muro, pra fugir da pobreza e da miséria, em situação de penúria, lançando fora qualquer vestígio de dignidade, arriscando o pouco que ainda resta. E fiquei pensando que nessa tão propagada globalização em que estamos afundados, há muros em todos os cantos. Principalmente, separando os mais miseráveis dos mais abastados. A aldeia global funciona bem para abrir novos mercados consumidores, ditar costumes, propagar ainda mais, o descartável. A aldeia global funciona, quando é preciso impôr ideologias, com a falsa impressão de que não se pode fugir a uma lógica existente. Como diria Milton Santos, "é como se o mundo se houvesse tornado, para todos, ao alcance da mão. Um avassalador dito global é apresentado como capaz de homogeneizar o planeta quando, na verdade, as diferenças locais são aprofundadas. Há uma busca de uniformidade, ao serviço dos atores hegemonônicos, mas o mundo se torna menos unido, tornando mais distante o sonho de uma cidadania verdadeiramente universal".

P.S. Na foto, atravessando os campos de soja, do oeste da Bahia.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Castelo de Areia

A mesma mão que me aplaude
me aponta.
O mesmo que me bajula
me vira as costas.
Posição e poder
trazem a coroa
e minha corte de volta.
Contanto que eu não ouse
tropeçar pelo caminho...
Seu apreço
castelo de areia

até que venha o próximo vento.
                                      (Tâmara Rossene)

domingo, 29 de junho de 2014


Depois da dureza de uma faxina que ocupou todo o meu sábado, fiquei aqui pensando em certa vez, em que alguém chegou num desses dias em minha casa e disse que jamais me imaginaria assim, de rodo na mão, focada no chão. De outra vez, a minha filha estava com o irmão nos braços na rua e outra pessoa lhe disse que bem sabia, como eram criados os filhos de mães muito ocupadas, pelos irmãos mais velhos, ou pelas babás. E finalizou dizendo que o meu filho deveria sentir mais carinho por ela e pela babá, do que por mim. Engraçado esses rotulos e terrível esse preconceito. Porque trabalho fora, não siginifica que não possa dignificar o meu papel de mãe, nem desprezar os cuidados com o meu lar! Embora alguns parentes muito próximos, adorem fazer piadinhas com as minhas prendas domésticas, eu posso fazer um bobó de camarão maravilhoso, ou optar por comprar aquela deliciosa feijoada que vende ali na esquina da Delegacia. Posso me esmerar em esfregar as manchas do piso até ficar clarinho, ou deixar a pia cheia de pratos durante todo um domingo, para me jogar no quintar com João. Posso passar horas na cozinha, imaginando e fazendo aquilo que a família adora saborear, ou passar horas com Mariana na cama, discutido o "sexo dos anjos". Porque aprendi que sou imperfeita! Posso falhar como mãe, como "mulher", com o meu trabalho, etc., etc. Por isso desisti de buscar a perfeição. Então me permito deixar um pouco a casa e curtir o domingo, trabalhar quarenta horas semanais, mais deixar tudo de lado a noite, prá ler um livro com meu filho, ou tomar um vinho com meu amado. Aprendi que sempre tem alguém criticando as suas escolhas, então, eu escolho e vivo tentando, ser feliz...E acho que isso vem dando certo, porque Celo, Mari e João, se sentem confortáveis em nosso cantinho e a frase que mais ouço quando estou em casa, é "Mamãe, vem cá!"...rsrs...

terça-feira, 24 de junho de 2014



Em muitas ruas por aqui, fogueiras acesas, gente nas portas, crianças em festa com os fogos... De repente voltei no tempo... A minha infância tinha esse sabor de festas juninas. E essa transformação do nosso jeito peculiar de saudar o São João, com mega eventos e forró eletrônico, sempre me assustou um bocado. Vendo meus filhos, meus sobrinhos e os filhos de nossa terra, comemorando ao nosso modo, me trouxe alento e esperança. Certeza de que a nossa fogueira continua acesa!

quinta-feira, 19 de junho de 2014



Sonhos de celofane
Planos de papel
nuvens esvaindo-se no céu...
E pensar que eu vaguei tanto!
E tudo bem ali 
escondido
no meu próprio recanto...



segunda-feira, 26 de maio de 2014


Essa foto é de um tempo, em que a minha família era o lugar mais seguro onde eu poderia estar. O colo da minha avó, era aconchego. As histórias da minha mãe, as melhores viagens. A voz do meu pai cantarolando, o melhor som. O abraço de todos que me rondavam, o melhor presente e o quintal da casa dos meus avós, o meu reino encantado... Depois o mundo ganhou outros contornos. E tudo aquilo me ronda a memória, da mesma forma que me ronda "As reinações de Narizinho", de Monteiro Lobato, como se tivesse sido um conto de fadas. E talvez tenha mesmo sido!

P.S. Na foto, o quintal da casa onde hoje é o escritório de Vovô Minervino, onde foi enterrado o meu umbigo e onde abriga memórias desse tempo...

quarta-feira, 7 de maio de 2014


Lendo sobre a Política Nacional de Saúde e Segurança do Trabalhador, fiquei aqui pensando, que nós, pobres assalariados, pouco sabemos a seu respeito... E que nem nos damos conta de que adoecemos cada vez mais pelas novas formas de produção, que nos exigem a multifuncionalidade, a proatividade, o domínio dos aparatos e ferramentas e ainda, a culpa... O velho dilema de estar empregado ao custo que nos é ofertado. Da cômoda aceitação, pela sobrevivência. Do fantasma do contingente de reserva, nos ditames do capital...

quarta-feira, 23 de abril de 2014


O moço vem me falando de Controle Social e eu divagando, com meus botões... Não fomos e nem estamos sendo educados para isso! Para pensar com senso de coletividade, a menos que estejamos sendo diretamente afetados. Dos 5.564 municípios brasileiros, quantos devem se gabar de ter o controle social exercido efetivamente pela sociedade civil? Primeiro vem a dificuldade com o trabalho voluntário dos Conselheiros, que não representam o governo. Depois, a falta de informação. Quantos dos membros dos diversos Conselhos que nos circundam (Da Criança e do Adolescente, Saúde, Assistência Social, Idoso, Mulher, Deficiente Físico, Habitação, Merenda Escolar, etc., etc.) são dotados de informações suficientes para exercerem o seu papel? Deliberar, fiscalizar, propôr, requer conhecimento do funcionamento da máquina pública e das suas nuances e conhecimentos das demandas do público a quem se destinam as políticas públicas. Com os resultados recém divulgados do IDH no Brasil, podemos constatar que avançamos, mas ainda temos muito chão prá percorrer. Ainda estamos tendo resultados desastrosos com a educação e nossa mão de obra ocupa algumas pesquisas, como sendo de qualidade duvidosa. E se estamos necessitando de itens básicos em nossa sobrevivência, será que iremos desviar os olhos dos nosso umbigos prá olhar a nossa volta? Mas não é apenas falta de interesse. Estamos despreparados. Controle social inscrito no campo legal foi um avanço. Tornar-se habitual, corriqueiro, sem que os mecanismos existam apenas para cumprir tabela, é sinal de amadurecimento. E nesse ponto, ainda acabamos de nascer...

quinta-feira, 10 de abril de 2014

 Hoje me lembrei desse poema do meu Pai. Porque tolamente acreditamos que não somos responsáveis pelas misérias que nos rondam. A culpa é sempre do estado, da família, da sociedade, do sistema... E nós vamos crucificando os monstros que nós mesmos criamos, nesse universo onde o coletivo só existe, se nossos interesses particulares estiverem sendo defendidos. É aquela coisa, o sujeito está gritando por socorro ao meu lado, mas embora eu lamente, a dor não é minha. E vamos seguindo... doando roupas e brinquedos nas datas festivas, ligando pro Criança Esperança, colocando notas fiscais nas urnas das instituições de caridade e acreditando que assim, estamos nos eximindo das nossas próprias culpas...

O EXCLUIDO
 Menino descalço,
Choroso desprezado
De origem humilde
Faminto engraxado
Das praças da vida
Pisado, cuspido
Chutado, agredido
Que insiste em viver
Em nome de uma “tal esperança”
Criado pelo ópio
De uma perversa sociedade
Nascida de dominante
Classe exploradora
Que o mantém excluído
Com alegria e prazer.
                       (Orlando Ribeiro de Andrade)

quinta-feira, 3 de abril de 2014




Foi numa visita ao "Museu da Loucura", em Barbacena - MG, em 2001, que tive a primeira aproximação com o universo dos portadores de transtornos mentais. A verdade por trás dos muros dos manicômios me incomodou absurdamente, com a visão dos objetos de tortura e de trapos humanos, que me olhavam como almas perdidas. Anos depois, o contato com o CAPS durante o período de estágio em Serviço Social me trouxe de volta essa angústia. Mas mesmo com a derrubada dos muros, pós reforma psiquiátrica, continuamos agindo como se eles existissem e continuamos preferindo os "loucos", amarrados e escondidos das nossas vistas. Como censurar as famílias, em estado de alerta para o próximo surto, se não lhes chega o preparo psicológico necessário para lidar com as suas fraquezas? como censurar quando, por diversas vezes, o benefício recebido pelo paciente é a única forma de prover o pão de cada dia do núcleo familiar ao qual pertence, impossibilitando-o de receber o tratamento necessário? e como transferir a responsabilidade apenas aos CAPS, com as suas diversas limitações na esfera dos municípios, como a ausência de profissionais qualificados, restrições orçamentárias e priorização na agenda das políticas públicas? Tenho profunda admiração por aqueles profissionais que ignoram tantos percalços e elegem a saúde mental como foco de atuação. Uma discussão que a coletividade prefere jogar embaixo do tapete. Citando o Livro da Tribo de 2013, "A julgar pelo aumento do uso de medicamentos antidepressivos e calmantes, estamos enlouquecendo mais a cada dia. E também estamos fingindo que a nossa loucura não existe".

P.S. Na foto, o pátio do Hospital Colônia de Barbacena, na década de 60, que já foi comparado a um campo nazista, pelo tratamento dispensado aos seus pacientes.

terça-feira, 1 de abril de 2014




E o mundo abriu-se!
Primeiro chegou meu pai
depois meu irmão
e longos anos após,
meu filho João!
Lideres, teimosos
e viris arianos 
Meus cavaleiros de abril...
Meu peito aberto, em sentimentos mil!

domingo, 30 de março de 2014


Enquanto cuida das minhas unhas, a moça vai me contando sua saga...De como a sua família chegou até aqui, trazida pela idéia de um novo Eldorado em Barreiras; do nascimento dos seus filhos e do risco corrido nas gestações. Eu, que fujo do burburinhos dos secadores, tinturas e comentários frívolos, me sinto melhor em estar ali no calor do seu lar, sem ter que opinar nas tendências da última moda. Aos poucos, vou me envolvendo com seu enredo. Em poucos minutos, fico sabendo que o que a motiva a continuar aqui é a distância entre o tempo da capital e o da pequena cidade, que correm de forma diferente. Me conta que prefere levar a sua vida de pouco luxo, mas de presença constante ao lado das três crianças e conclui para si mesma, que essa foi a melhor escolha, quando teve que decidir. Ao final do trabalho, vejo que está feliz. Acostumada ao converseiro das clientes, encontrou os meus ouvidos abertos para escutar a sua história. Saí de lá convencida de que preciso prestar mais atenção nessa infinidade de historias que estão prontas para serem contadas a minha volta e me lembrei de um poema antigo, que reproduzo aqui, mais uma vez....

SONHOS
O que sonha aquela moça de passos ligeiros
entoando hinos de igreja
como quem festeja?
eu aqui a olhar esse vilarejo
sonhando em viagens pelo mundo
no grau de doutor
e no preço do meu segundo!
olhando aquela velha na porta
o menino pulando corda
essa vida simples do interior.
A moça diz que sonha
com uma escada de filhos
um marido, muito íntegro
olhando as flores do quintal.
Quanta pretensão a minha
julgar maiores os meus planos
egoístas e mundanos
sem essa essência de quem sonha
apenas prá amar e ser feliz!
(Tâmara Rossene)


quinta-feira, 27 de março de 2014

Há uns dois anos, quando João Marcelo estava no auge da intolerância a lactose, que nos assombrava, cheguei em casa mais cedo, num dia complicado e cheio de preocupações. Naquela época, a lata de leite que ele tomava, custava pouco mais de cem reais, dez vezes mais do que o leite normal custaria. De repente para um carro em minha porta e uma mulher loira me chama. Seu rosto me é familiar, mas pouco sei a seu respeito. Depois de me esclarecer a sua identidade, passa a perguntar sobre a intolerância do meu João e a relatar que o seu filho teria o mesmo problema. Eu não sabia qual o seu propósito em ter ido até ali, mas de repente ela começa a falar do meu pai e a dizer que há poucos dias soube ser eu a sua filha e da  intolerância de João... E de repente me diz do respeito que tinha pelo sábio Orlando e me fala das latas de leite que recebia, acho que de uma amiga, que morava em outro estado. E que tem latas a mais em casa. E de repente me doa 10 latas de leite. O valor daquilo tudo foi inestimável! Muito maior do que o que o financeiro representava! Só quem tem um filho com a saúde abalada, sabe do que estou falando. Hoje João se curou do problema, mas fiquei aqui pensando na atitude dessa pessoa e no quanto me senti afagada num dia de agonia. E no quanto senti a presença do meu pai ao meu lado, naquele momento. E fiquei pensando que essa coisa de fazer o bem transcende barreiras. Apesar da sua ausência física, a ação dessa moça, foi reflexo das sementes lançadas por ele...
Vendo muitas pessoas comprando porque todo mundo compra, assistindo porque todo mundo assiste, reproduzindo o que está na boca, na cabeça, no corpo, do todo... é como se fossem máquinas programadas! Estou eu cá a observar, como em alguns filmes, como se eu estivesse em outra dimensão. Não sei se é vantagem estar nessa posição. Talvez, se estivesse indo na direção deles, me sentiria menos solitária. Ou, quem sabe, talvez não sentiria nenhuma dor...
                                                                                                                    (Tâmara Rossene)

domingo, 23 de março de 2014



O ano era 1979. O rio estava subindo muito e meu avô Minervino, passando uns dias conosco em Salvador, contava que as ilhas já estavam cobertas, quando na televisão, começam a noticiar que as águas, em Ibotirama, invadiram as casas da cidade. O meu avô, desesperado, volta imaginando como encontraria a minha avó Anália. Ali, na esquina da rua JJ Seabra, onde hoje ele tem um escritório, a sua Anália não estava mais, porque o rio São Francisco já tinha reclamado o seu espaço. Então, seu Miné saiu de porta em porta, perguntando por ela. Encontrou-a na casa de conhecidos, saíra as pressas, com a água na canela e o desejo que ele retornasse logo. Naquele tempo, eu era uma meninota e brincava dizendo que Ibotirama era uma ilha. E era... ficávamos ilhados, sem telefone, sem celular, sem internet, sem notícias velozes correndo trecho. E o melhor de tudo é que éramos felizes! Depois tudo isso chegou até nós e mesmo com os benefícios da era tecnológica, não ficamos mais felizes do que antes. Muitas vezes acho que continuamos agindo como se fôssemos uma ilha, tendo visões em círculos, olhando prá um mundo pequenininho, não ousando expandir os nossos limites, como se os obstáculos ainda fossem os mesmos daquele tempo...

(Na foto, a enchente...)

sexta-feira, 21 de março de 2014



Minh' alma sempre em festa
incomoda os incrédulos
repele os pessimistas
afasta os que carregam
eterno pesar.
Sou para muitos deles
poço de fingimento
apenas porque não lhes chegam
os "ais" dos meus lamentos.
E embora não me faltem
os tormentos e as agonias
não se afeiçoam de mim
aqueles que são avessos
a fluidez e alegria...

                   (Tâmara Rossene)