domingo, 27 de fevereiro de 2011
Sangue
Esse é o meu lugar!
Minha terra tem barquinhos que rumam para o infinito.
Tem flores brejeiras no mato.
Tem gosto de milho e feijão quando chove.
Tem cheiro de água barrenta
e tons coloridos no céu de sertão!
Então por que meu Deus?
tem meninos descalços
com pés mergulhados em lamas fétidas
de braços abertos como se estivessem
em um campo florido.
Tem mãos encardidas segurando o pão dormido
que sobrou do café de ontem.
De quem teve café ontem.
E tem velhos desdentados e de olhar triste
sobre as cercas escurecidas
como celas mal cuidadas.
Com seus atalhos e descaminhos
esse é meu lugar!
Quisera poder transformá-lo
Na terra dos meus sonhos!
(Tâmara Rossene)
Uma poesia de meu pai...chamada Rotina...
Todo dia!
O mesmo trabalho
A mesma lida.
Com cansaços e fadigas
O itinerário repetido
E cenário inalterável.
Nada muda!
A mesma bebida
O mesmo cumprimento
Aos vizinhos da direita e da esquerda
Os mesmos pratos
Saboreados com o apetite de sempre.
Nada Renovado!
Quotidiano simples
De uma vida
Inteira...
A princípio fiquei indignada com a demolição das barracas na orla de Salvador. A meu ver, tudo poderia ter sido resolvido de uma outra forma, com uma substituição gradual dessas estruturas, evitando um maior caos social, já que Salvador possui índices elevados de desemprego. No entanto, não era difícil perceber que havia mega estruturas montadas, impedindo o acesso democrático a praia, um patrimônio de “nós todos”. Passado algum tempo das imagens chocantes das demolições, do choro incontido de muitos e dos escombros a beira mar, a paisagem mostra uma praia livre. Fiquei surpresa com as pessoas voltando a ir a praia levando a velha dupla cadeirinha e guarda sol. E mais ainda, com crianças, toalhas e baldinhos colorindo as areias, com expressões felizes, em substituição a exploração comercial que por ali reinava. Mostra de que há sempre um outro lado, mesmo que as evidências só mostrem um deles.
Mariana, desmistificada...
A minha filha Mariana, adolescente de 14 anos, só anda cheia de anéis e pulseiras coloridas, com um colar preso ao pescoço, de onde pendem dois anéis prateados. Antes de virar moda, já usava uma unha de cada cor. Escreve crônica e poesia. Declama poesias como se fosse dona de todos os sentimentos. É temperamental e cheia de argumentos. Ganha o mundo com argumentos. E a admiração de amigos e colegas que a cercam. Tem um blog onde registra as suas impressões e muitos seguidores. Mas quando o sono chega e está prestes a dormir, eu me dirijo até o seu quarto e tiro um a um, anéis, pulseiras e colares, desfazendo a caracterização daquela personagem. Dou-lhe um beijo na testa e em cada lado do rosto. Digo que a amo. E imediatamente vejo o mesmo sorriso daquela menininha insegura de um ano, prestes a dar o primeiro passo. Penso que para mim ela guarda a sua melhor porção: vê-la assim sem capas, sem armas, sem trajes, como verdadeiramente é...
P.S. Acessem o blog http//:psicosedemultiplaescolha.blogspot.com
domingo, 20 de fevereiro de 2011
Cotidiano
Progresso...
No meio do dia, operários presos em andaimes, colocam pequenas pastilhas de cerâmica num majestoso prédio de mais de trinta andares. São cuidadosos e precisos, mesmo correndo riscos. Fico pensando em como devem admirar aquela obra. Mas que quando estiver pronta, terá circulando em seus corredores cheios de câmaras de segurança, homens com aura de poder, carregando seus laptops e celulares. E esses pobres homens que agora moldam o prédio, apenas poderão contemplá-lo como estou eu agora: do lado de fora!
Tâmara Rossene
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Castelo de Areia
A mesma mão que me aplaude
me aponta.
O mesmo que me bajula
me vira as costas.
Posição e poder
trazem a coroa
e minha corte de volta!
Contanto que eu não ouse
tropeçar pelo caminho.
Seu apreço
castelo de areia...
Até que venha o próximo vento!
(Tâmara Rossene)
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
Amor desmedido...
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
Uma poesia de meu pai...
ESTRANHA REALIDADE
Não compreendo guerra pela paz,
Corrupção por status
Miséria por economia
Violência por pacificação
Omissão por sensatez
Mentira por necessidade
Traição por lealdade
Preconceito por virtude
Pudor por conveniência
Moralidade por imposição
O que existe em suma
É muita hipocrisia
E a fragilidade do homem
Que não se conscientiza.
(Orlando Ribeiro de Andrade)
segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011
Como tudo começou...
Água de chocalho
Escorre
Dentro...
No silêncio
O chocalho
Treme...
Quero falar!
Um desejo
Incontido e constante
Queima.
Em carne viva
A agonia.
Um dilacerar oculto
Me aflige
Dia e noite
Como um açoite
De mulher
Que teme
Uma história do passado...
Um bêbado no labirinto
No meio da nossa correria, eis que entra um bêbado. Percebemos que ele zanzava pelo corredor, mas não dávamos a menor importância, apenas nos desviávamos do seu caminho, mesmo porque aquele não era um simples bêbado, mas um parente muito próximo, e já nos acostumáramos a sua farra habitual entre as garrafas. O bêbado saiu do corredor e passou a explorar os compartimentos da casa. Nesse momento um de nós percebe que ele está perdido. Sai de um quarto, entra na cozinha. Entra numa porta, dá
O bêbado não imagina a algazarra que está provocando na meninada, nem que havia sido descoberto naquele desespero e perdido, começa a raciocinar como sairá daquele lugar, sem dar ousadia para aqueles moleques, porque menino não é trem de gente. Sente os bolsos pesados. O filho da puta do dono do bar, aproveitando-se do seu estado, lhe passara o troco todinho de moeda. Eis que uma idéia lhe surge. Chama as crianças que agora o rodeiam. E fala com dificuldade: - Vocês querem comprar uma balinha?. Remexe nos bolsos e retira de lá o tesouro que servirá de passaporte para sair daquele lugar. – Dou tudo isto a vocês se forem agorinha mesmo. Os meninos tentam lhe arrancar as moedas. Juntando as poucas forças que ainda lhe restam, o bebadozinho fecha as mãos e volta a negociar. – Mas só entrego se vocês saírem agora pra comprar, senão eu tomo tudo de volta! Os meninos gritam em festa e aceitam o acordo. O bebum passa as suas mãos os metais. Alguns rolam no chão. Os garotos se agacham para recolher e o negociador mais tonto ainda com o barulho e o calor a sua volta, grita: - Agora, senão eu tomo! A criançada sai correndo e o bêbado acompanha aos tropeços, a saída do labirinto, quase se atirando aos pés da meninada, feliz por finalmente encontrar o caminho de volta. Quando consegue enxergar a luz do poste da rua, na porta da casa, dá uma gargalhada e diz prá si próprio: - E Zefa ainda diz que eu não sou inteligente!
(Tâmara Rossene)