quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Era começo de dezembro, janeiro se aproximava e traria nossa filha, quando estivesse findando. Nós éramos jovens e o futuro era incerto. Marcelo correndo de um lado para outro, dando aulas avulsas, o contrato do estágio no Colégio Luís Viana terminando, pensando em como aliviaria ter um emprego formal. Num desses dias de desânimo e esperança, entregando currículos numa Salvador com milhares de desempregados, com oportunidades ainda mais reduzidas para um jovem universitário, negro; uma de suas tias, meio tia, meio mãe, tia Loura, perguntou porque ele não segurava no andor de Santa Bárbara, na festa que aconteceria dali a dois dias. A Santa, certamente se compadeceria dele e ajudaria. A tia, a avó e outros parentes moravam justamente no Conjunto Santa Bárbara, em Brotas. E a festa seria pelas ruas de acesso aos prédios, como em todos os anos. Meio desanimado, ele deu dinheiro para alguns pacotes de velas e no dia e hora marcados, segurava o andor, pensando em seu pedido. Cansado e inseguro, olhou para os olhos da Santa, para o vestido vermelho da imagem, rodeado de flores e acertou o passo com o de homens e Senhorinhas, entre agradecimentos e súplicas. Voltou ansioso e preocupado para mais uma maratona de aulas de reforço de matemática, mais tarde, a sala de aula também lhe aguardava. Dois dias depois, já havia deixado adormecido o pedido, para não gerar expectativas maiores, quando uma outra tia lhe telefona e diz: Marcelo, uma amiga me ofereceu uma oportunidade de emprego e eu disse que preferia lhe indicar, porque a sua filha está para nascer. Ele parou ouvindo, coração acelerando. Ela prosseguiu: é na Telebahia, é um contrato de três meses apenas, mas, quem sabe... você deve ir amanhã e procurá-la no quarto andar, no Itaigara. Meio assustado e temendo gerar mais uma expectativa frustrada, respirou profundamente. Depois ouviu tia Mana completar: Procure por Bárbara. Naquele momento, ele se lembrou do andor, das velas, da peregrinação dos currículos, das descrenças, enquanto o nome Bárbara ecoava, feito trovão... O contrato de três meses se transformou em sete anos, em outras funções, em desafios vencidos.
Vinte e três anos depois, ainda nos lembramos, como se fosse ontem. São caminhos que o sagrado percorre para desafiar a nossa fé. Viva Santa Bárbara!