domingo, 24 de março de 2013

Prá reavivar a memória....


Hoje Vovô Minervino me apareceu por aqui...uma pena não ter registrado em fotografia. De repente ele passou a me narrar a história abaixo. Parava e recomeçava, como se estivesse puxando a memória...

Lá pelos idos de 1933, Padre Cícero andou por estas bandas...Aquela época o meu avô contava com apenas 04 anos. A igreja que imaginamos como tendo sido a primeira, na verdade foi a segunda, ali no início da rua JJ Seabra, onde hoje é o comércio de Chica de Edimar, havia uma pequena capela, chamada capela do Bom Jardim e foi ali que a missa do Padre Cícero foi celebrada. Parte do povo estava no interior da igreja e a outra parte, do lado de fora, imagino que pelo tamanho. E na parte externa, um converseiro sem parar, dos homens, falando sobre animais, sobre o comércio, sobre a vida que viviam...Padre Cícero pede silêncio e prossegue em sua missão. O burburinho recomeça. Disputa entre o sermão do Padre e a conversa sem fim dos fiéis. Padre Cícero, que era tido como um homem Santo, muda o tom da pregação e diz que esse lugar que se chamava Bom Jardim, haveria um tempo, em que se transformaria num Mal Jardim. E meu avô vai emendando um fato noutro e me relata que nessa mesma época Padre Cícero celebrou uma missa nas Carnaíbas, na casa do pai de Jadinho e que foi a pé, junto com várias pessoas da Vila, que caminharam por cerca de duas horas. Junto com eles, estava o pai do meu avô, Samuel. E que no caminho de volta, alguns discutiam se o tal homem, era ou não era mesmo um Santo. E que uma chuva começou a cair e pediram para o Padre esperar, mas que este relutou, dizendo ser a chuva um sinal sagrado. A chuva parece que caía atrás deles e na frente. Todos pisoteando um verdadeiro lamaçal, a enxurrada da chuva que ia caíndo a frente deles, mas sem molhá-los. Era como se a chuva só não caísse sobre eles. Chegaram todos secos. Mas só depois se deram conta do que havia acontecido. Por isso essa história do Bom Jardim ficou martelando a cabeça desses homens por muitos anos, porque notaram que havia algo de diferente naquele homem, cuja fama corria solta e temiam a profecia do Santo...

P.S. Acima, uma foto da Igreja Nossa Senhora da Guia,segundo vovô Minervino, construída em 1943, tendo como grande colaborador o Coronel Zezé, avô de Dona Nieta, de Seu Vercinho. Demorou uns cinco anos prá ficar pronta. Uma pena terem derrubado a capelinha, mas fica aí o registro prá afiar a memória...

domingo, 17 de março de 2013


Antigamente
dias e dias
as imagens se repetiam
a cabeça se entristecia.
Agora...
 um tiro pela manhã
 um terremoto durante o jantar
um sequestro seguido de morte antes de me deitar.
 E acordo 
como se nada tivesse acontecido
como se tudo tivesse sido
comum...
Eu sigo meu curso
como todo mundo
preparada para novas cenas. 
Não sei o que é mais crível...
se esse cotidiano trágico banalizo 
ou se estou ficando insensível.
(Tâmara Rossene)

P.S. Na foto, uma benzedeira nossa, clicada pro mapeamento de cultura, prá afastar os fantasmas do mundo moderno.

quarta-feira, 6 de março de 2013

Enquanto lá fora
o vento toca
a flor se abre
a chuva faz festa
sob o sol
a hora cá dentro
é morta.
O ar é gélido
os gestos maquinais
e apenas a superfície
deixa se mostrar.
Lá fora (ao que parece)
a terra gira
enquanto eu observo
do vidro
temendo que um dia
me enterrem
sob papéis.
   
 (Tâmara Rossene)

P.S. Publicado no Libro da Tribo - 2013.

sexta-feira, 1 de março de 2013


Estava assistindo a um documentário sobre o Haiti, no ultimo final de semana. E ao invés da reação que sempre me acomete, de tristeza e piedade, me ocorreu que estamos permitindo um campo de concentração sob nossos olhos. Comida, remédios e caridade apenas, não modificarão aquela realidade. É preciso investir em infra estrutura. É preciso construir uma sociedade real, com equipamentos urbanos, instituições, moradias, ferramentas para assegurar a diginidade. Pensei na definição de purgatório e inferno. Lembrei de lugares próximos a nós, onde a miséria também ronda... Pensei na fantasia de uma rainha de bateria de escola de samba, anunciando que a mesma custaria em torno de cento e cinquenta mil reais. Não resisti a fazer comparativos. Seis casas populares construídas, uma quadra de esportes, três laboratórios de informática, duas salas de leitura, um micro-ônibus para transporte escolar. Fiquei me perguntando se dez, vinte, fantasias de igual valor, custeariam quais benefícios para a coletividade. Fiquei me perguntando: Uma sapucaí lotada ou uma comunidade vivendo em condições mais humanas? A alegria fugaz a cada ano, para poucos, ou a felicidade coletiva de viver com mais dignidade? Perdi o sono pensando que Hittler instalava câmaras de gás e abreviava a morte. Mas que essa natureza de conceder esmolas, me trás a sensação de que prolonga os dias, mas que eles permanecem contados...

P.S. Na foto, a comunidade da Ilha Grande reunida, tecendo em palha de milho, de forma tão salutar, em contraponto as comunidades a que se referem o texto.