terça-feira, 20 de setembro de 2011

De volta as lendas...





Talvez o ano fosse 1975, ou 76, não sei bem ao certo... Meu avô materno tinha uma pequena fazenda (segundo ele era uma fazenda) chamada Ponta da Serra, que ficava na estrada do Boqueirão. Até hoje a casa construída por ele resiste em frente a estrada. Os mesmos degraus que pareciam imensos para mim naquela época, agora já diminutos. As portas e janelas permanecem cerradas, como se alguém os abrisse, de repente, o mundo voltaria a ser como era antes... Iamos para lá de jipe, nos finais de semana. Engraçado como parece que quando me lembro do jipe, automaticamente me vem o brilho nos olhos do meu avô, ao volante... Da casa avistava-se uma serra, que a noite era como uma sombra solta no espaço. Em algumas noites, uma grande bola de fogo brilhava no céu... Subia e descia provocando um clarão. Diziam que era ouro enterrado. Encantado. Que era preciso ser muito corajoso para ir até onde a bola circulava, procurando em seu raio o tal ouro escondido e cavar a sua procura. Mas que aquele que ousasse procurá-lo, teria que enfrentar uma série de assombrações e fantasmas. Assim me contavam, enquanto os meus olhos atentos cresciam a luz de candeeiros. A sombra da noite parecia aumentar ainda mais o meu medo. Para mim, a bola brilhava mais do que a lua cheia e povoava os meus sonhos. Certa vez vi homens atirando em sua direção. E sonhei com bravos cavaleiros se atirando sob objetos reluzentes que caíam do céu... Não sei se a minha imaginação aumentava os fatos. Ou se o objeto circular era da magnitude que me lembro. Mas nunca soube de ninguém que enriquecera a custa dessa proeza. Ou nunca existiu homem de coragem suficiente. Ou existem caminhos menos árduos ou mais fáceis para somar riquezas. Ou não olhamos mais para o céu a cata de mistérios. De qualquer forma, é necessário voltar sempre a esse tempo e registrar. Enquanto ainda me resta essa capacidade de olhar para o céu de outrora...

P.S. Na foto, João Marcelo, cavando o chão, quem sabe um homem corajoso, a procura de um tesouro perdido....rsr...

domingo, 18 de setembro de 2011




Domingo na casa de tio Bé... Tanto tempo sem me reunir com a família embrião, que havia me esquecido o quanto faz bem, de vez em quando, olhar prás origens... O churrasco e a cervejinha fizeram pano de fundo prás histórias que já ouvi incontáveis vezes... em muitas delas, eu era a personagem principal. Historinhas da minha infância que espero ainda retratar por aqui...O fundo musical a lá Mera, com resgates do tempo das cavernas, foi como se me embalasse. Tantas músicas que me trouxeram a face de meu pai, em sua eterna boemia...Olhando Nalvinha lavando pratos sorridente, minha mãe e Tia Dó cantando, Marcelo desestressado, meus sobrinhos e filhos em festa, foi como estar ao pé do fogão de lenha da Velha Anália, apesar disso ter sido noutro tempo, noutro quintal. Tio Bé ali a minha frente, tão vivo em minhas lembranças... Lindo quando andava com as duas filhas de bicicleta pela cidade, quando estas tinhas três e cinco anos. July no quadro da bicicleta e Tacy na garupa. Uma branca e a outra morena. Uma Nalva e a outra Mera. Ele dizia que uma havia sido feita de dia e a outra de noite...rsrs... Pena não ter registrado em fotografia aquelas imagens da bicicleta. Lembro-me dele em Barreiras, Salvador, Ibotirama... Sempre a minha volta. Rindo ou provocando meu geniozinho de menina mimada e calunduzeira. Um pedaço grande de minha existência em suas piadas infindas... Me trouxe a cabeça esse trechinho que escrevi num dia distante, tentando traduzir a palavra família...
Ai, como ouço queixumes de ti!
Uns e outros requisitando atenções e mimos.
Mas quem dera houvesse harmonia em tudo o que há neste mundo!
E em dias assim
sinto-me parte e grata
por ter um laço que me prende
nessa imensidão...
Acima, uma foto de parte da família materna, em 2008, reunida na casa de Orla... E outra da formatura de Taci, entre Vovô e Bé, dormindo no final da festa...rsrs...

Esses pensadores andam tomando meus pensamentos...rsrs... Um poeminha a toa, que andei rabiscando durante uma das aulas de Sociologia...


Que me perdoe Durkeim
mas ainda que me pese
essa degradada natureza humana
é fruto do que íntimo se cria.
E ainda que se fundamentem teorias
o mal externo
vem do que há por dentro.
Te trocarei por Goethe e Weber
negando teu positivismo
nos caminhos subjetivos
que não cabem pragmáticas.
O externo adentra em mim
e eu me derramo sobre ele
natureza fática.
Quisera eu que teu funcionalismo
fosse a clareza desse meu espírito
mas o homem é torpe e turvo
e esse caos cá fora
é produto que se concebe
e finca raízes
no fundo...

(Tâmara Rossene)
Houve um tempo na minha infância que ainda ouvia alguns dizerem que "comunista comia criancinha"... O pior é que alguns falavam isso não por ignorância, mas por conveniência política, puro joguete para "salvar" o sistema a sua volta, à custa da ignorância alheia. O texto abaixo me foi enviado por e-mail por um filósofo (de formação mesmo, rsrs), que divide os dias de labuta comigo. Cavaleiro, íntegro e polido. Por suas contribuições diárias nas minhas reflexões, posto aqui para homenageá-lo...

Rossene, ontem, no momento em que eu lhe chamava de comunista e marxista, quando saíamos do “trampo”, lembrei-me do meu avô (como sempre lembro ao tratar dos aspectos dos ideais comunistas). Ele tinha um verdadeiro pavor do regime comunista por ele imaginado, com a contribuição do rádio da sua época - assim creio -, mantido pelo governo.
Dizia ele: “os comunistas não podem entrar no governo, porque vão invadir as casas dos outros e as terras dos outros e dividir. Isto é justo, o trabalho alheio ser tomado assim?”
Não me recordo exatamente a época, mas me lembro que era bem criança e obviamente não entendia o que ouvia, contudo, conceitos tidos como comunistas permearam a minha mente como algo ruim, embora não soubesse exatamente do que se tratava, até o contato com textos que abordavam o assunto.
Nascido em 1938, não alfabetizado e sempre residindo no sertão, creio que ele estava alheio à tentativa de golpe em ocorrida 1935 (com influência da denominada Internacional Comunista, braço do regime soviético na época); do boato do chamado “Plano Cohen"), em 1937, no qual surgiu um documento descrevendo como seria uma insurreição comunista (com massacres, saques, depredações, invasão e desrespeito ao lares, incêndios à igrejas, etc.); e também das atrocidades cometidas por Stálin na extinta União Soviética. De igual forma à repressão praticada contra o Partido Comunista Brasileiro, sobretudo no período de 30 a 47 - quando culminou com a cassação do seu registro pelo Supremo Tribunal Federal (o que ele comemoraria, apesar de não entender bem as “macro-implicações” daquele ato) -, assim como em grande parte da década de 60.
Mas, além do rádio, ele também tinha outro disseminador anticomunista: a Igreja Católica, pois ele é católico (antes de ser cadomblecista). Esta, como é sabido, sempre se opôs a qualquer implantação de um governo comunista ou socialista, chegando a expedir um documento, em 1949, excomungando automaticamente quem apoiasse ideias comunistas ou socialistas, afirmando que estes regimes e suas ideias eram contrários aos preceitos cristãos, pois, dentre outras coisas, “violava a ordem, negava direitos, dignidade e liberdade”. Muitos outros discursos foram proferidos em períodos anteriores e posteriores a este, e disseminados pelo mundo, não é demais crer que tenham chegado algo a ele, não sei exatamente por qual meio. Mais, porque na sua juventude, em momentos anteriores ao período militar esta mesma igreja – dentre outros, através dos Bispos Dom Geraldo Sigaud e Dom Castro Mayer -, patrocinou fortes movimentos anticomunistas, exacerbando os seus aspectos ruins, mesmo crendo que o aumento da simpatia comunista se devia a males advindos do regime econômico capitalista.
Enfim, foi bem interiorizada na mente dele o que significava o comunismo, e inevitavelmente era transferido aos que viviam a seu redor. Eu não sabia o que era, mas “sabia” que era ruim. E, sim, até hoje ele mantem o mesmo medo e não há quem o faça entender de outra forma.
Chega, Rossene! O seu blog está me afetando. Você é uma saudosista (sim, uma saudosista) e acaba me remetendo às minhas relações e contextos passados.

Att., Irlan

domingo, 4 de setembro de 2011

Hoje estive na igreja do bairro São Francisco prá dar um testemunho de uma graça que me foi concedida. Mas esses caminhos que o criador usa para chegar até a mim, ou para que eu chegue até a ele, será tema de outro dia. Fiquei observando a Igreja lotada e pensando que algumas igrejas me tocam pela mistura de classes. Pobres e ricos, afortunados e desafortunados em riquezas materiais, no mesmo espaço. Cantando juntos, desejando um mundo melhor, num clima de irmandade. Fiquei até um pouco mais crédula. Afinal, junção de classes nos últimos tempos, só tenho visto nas novelinhas globais...rsrs... Uma senhora ao meu lado, tão velhinha, que a coluna já não a deixava em posição ereta, junto com tantas outras, pareciam o retrato da devoção. Quando a minha filha lhe estendeu a mão para desejar a paz de Cristo, ela lhe deu um abraço imenso. Talvez estivesse sozinha, talvez precisando de um abraço, ou talvez quisesse nos salvar, ou nos acolher, com aquele gesto. Também fiquei imaginando o quão difícil deva ser conduzir uma igreja, já que padres e pastores são de carne e osso como nós. Será que se permitem duvidar, descrer? Quantas contradições devem cercá-los nesse trajeto... Bem, abaixo posto algo que escrevi há anos e que casa muito bem com o relato acima.

D E U S
Hoje eu caí.
Você me levantou
e me soprou a poeira dos olhos.
Estou triste
Não posso dividir esse presente.
Encontrei ao meu redor
uma infinidade de cegos.
(Tâmara Rossene)

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Cotidiano


Cenas que me rodeiam todos os dias.
Não sinto.
Não percebo.
Não pouso o meu olhar maquinal.
Mas ao cair da noite.
Quando me aquieto.
Sinto falta de calma
prá observar que a felicidade
está em pedacinhos do que vivo
todos os dias.
Nos recantos da casa.
Nos sabores que provo.
Nas pessoas que estão a me rodear.
Naquilo que penso cotidiano
mas que não ficarão para sempre...

(Tâmara Rossene)

(Mari e minha mãe lavando roupa em Vitória da Conquista, clicadas por mim, há uns quatro anos)

O mundo termina logo ali...
ao final da estrada onde minha avó esperava
sem luz, sem tv, sem internet
sem saber de homicídios, atentados
e notícias de um cenário que eu nem imaginava
que um dia existiria.
As novidades chegavam por cartas
e pela telefonista
do outro lado da linha.
Agora são estradas que se cruzam virtuais
levando más notícias nos quatro cantos.
Em lugares onde cartas já não chegam
e ninguém me espera...
Logo eu que naquela época era apenas uma
e que hoje sou tantas
numa polivalência que me mantém sobrevivendo
mas que me relega a solidão...

(Tâmara Rossene)

P.S. A foto tem uns quatro anos. Mariana e Amanda Carinhanha, clicadas por mim...