quarta-feira, 31 de outubro de 2018


Hoje eu acordei pensando nas manifestações da cultura popular dessas terras ribeirinhas. Pensando que nós, num território tão distante do semi-árido, já nascemos marcados pelo nomadismo. Distantes a 600 e tantos quilômetros da capital baiana e a mais de 800 de Brasília, desde cedo aprendemos a migrar. Migramos para estudar, para trabalhar, por atendimento médico, por melhores condições... Mas a cultura popular persiste nesse lugar do esquecido, nesse território do invisível. Em meio aos discursos de que está acabando, a negação e a afirmativas que lhe desqualificam (são vagabundos, cachaceiros, pedintes). Migraram do Centro da cidade, para a periferia. Mas, resiste. E de certa forma, nós todos, integrantes de um território em constante trânsito, fugindo a invisibilidade e aos discursos que também nos negam, resistimos também...

P.S. Na foto, o Reis de Nêga.

segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Mais um dia. Eu sou silêncio e dias que se repetem. E eu que já quis ser, bolas de sabão carregadas pelo vento, estouradas ao acaso. Mas existo e isso é uma eternidade. Existir dói. São calos que se renovam e sangram. São dias que começam e terminam iguais. São dores que latejam do mesmo jeito. É o mesmo jeito e a gente fingindo que está recriando. Existir é repetir no infinito. Eu continuo querendo ser as bolas que estouram, coloridas. Ser feliz, deve ser existir no instantâneo...

terça-feira, 16 de outubro de 2018

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Estou numa viagem desconfortável de 12, 13, 14 horas. Entre os cochilos na poltrona dura do ônibus, acordo e vejo que a pessoa que está acomodada do outro lado do corredor, está deitada nas duas poltronas, mas resolve esticar as pernas até o braço da minha cadeira do outro lado. Eu me reviro, tentando mostrar insatisfação, mas o passageiro abre os olhos, me fita e segue com os pés presos a minha poltrona, como isso não fosse a meu respeito. Mudo de posição e tento mais um cochilo. Então me recordo do dia anterior. No supermercado, em frente a uma prateleira, olhando os preços dos produtos, alguém estica o braço sobre o meu ombro, e pega uma lata de leite. Não me pede licença, nem desculpas, nem moça, por favor... Como se eu não estivesse naquele lugar, ou como se eu não importasse. Depois me recordo da mulher que quase me atropela na rodoviária e eu apenas estava no mesmo trajeto, mas havia opções de desvio a nossa volta. A forma que ela me olhou, era como se eu estivesse no lugar errado, embora nós duas tivéssemos o direito de ocupar aquele lugar. O guarda chuvas que ela segurava machucou o meu braço, mas ela apenas puxou o objeto, sem olhar para mim. Noutro dia meu filho estava sentando em um canteiro, na porta de uma loja, e uma Senhora conversando animadamente com duas amigas, esticou o braço prá jogar uma embalagem vazia dentro do canteiro. A embalagem caiu exatamente na cabeça do meu filho que gritou. Eu me virei prá olhar e elas passaram sorrindo e gesticulando, sem nenhuma preocupação com o lugar errado do lixo, ou com o menino que gritara. Lembro bem do show do Palavra Cantada na Concha Acústica, em Salvador. Chegamos cedo prá ocupar um lugar em frente ao palco. Mas as pessoas que foram chegando depois, empurravam, fingiam que estavam onde não estavam, para garantir um posicionamento melhor, intimidavam as outras com grosserias, diziam que tinham chegado primeiro. E eram pais e mães com os seus filhos! 
Percebo que as pessoas estão invadindo o espaço alheio como se não houvessem mais limites, como se não fosse necessário pedir permissão ou se desculpar. Primeiro veio aquela idéia de que isso ocorria nas redes sociais, porque o mundo virtual encorajava os posicionamentos, incentivava os discursos, varria prá longe a timidez e as reservas. Porque se você postava na sua página, a rede era pública, então você estava sujeito as ofensas, aos absurdos ditos (foi assim que me justificaram, embora eu discorde veementemente). Mas parece que assim como aquela ideia de que alguns atiradores de universos virtuais saíram matando no mundo real, as realidades estão se misturando. Das ofensas na rede, estamos nos enredando aqui do lado de fora, num caminho obscuro. Talvez porque na intensidade das navegações, as máscaras já foram derrubadas e os personagens que trafegam lá, são os mesmos do lado de cá.


Foto retirada da página https://blog.pianetadonna.it/fiorecarmelina/riconoscere-le-persone-ipocrite-comportarsi/