sábado, 9 de abril de 2016

Nas estradas do Pós crítica...

A mulher lança o menino de uns dois anos, no banco duro ao meu lado. E vai gritando para ele dormir logo. Do outro lado do banco, um homem de cerca de trinta anos, com uma mochila enorme e um expositor de brincos, me dizendo que foi assaltado e pedindo dinheiro para um café. Após uma primeira negativa, ele começa a desenrolar uma história interminável. Não me convence, mas lhe estendo dois reais, desejando o silêncio. Ele apanha o dinheiro, sorrindo e agradecendo e continua fazendo o seu relato. Do outro lado do lugar onde me encontro, uma Senhora se arrasta, com um lenço florido na cabeça e um caroço enorme na lateral do rosto. Afasto o olhar. Calor e cansaço. Olho o relógio e ainda restam duas horas para aguardar o ônibus. A criança continua sem dormir e a mulher continua a falar para ela, que é melhor fechar os olhos. Depois para e diz que o garoto precisará de carinho, porque foi afastado do irmão. E repete para si mesma: burrice e escolha mal feita. Uma mulher chora ao telefone, encostada a um canto. A minha volta, sacolas e mochilas se arrastando junto aos corpos. O homem agora me pede para olhar a mochila e antes que eu responda, sai dizendo que vai tomar o tal café. Uma moça me oferece livretos de cordel e antes que eu entenda o que está dizendo, estende-os a pessoa ao meu lado. Barulho de gente conversando alto. Som de murmúrios. Me sinto numa trincheira de guerra. Ou, entre almas que vagam, desejando libertação. E a caldeira me consumindo. Movida por um impulso, praticamente corro até o banheiro da rodoviária e pago por um banho. Um alívio imenso percorre a minha alma. Em frente ao espelho fico me perguntando quando todas aquelas marcas se fixaram ao meu rosto. Recuso o meu semblante pálido de duas noites mal dormidas, de aparência exausta e da corrosão do tempo. Vou ajeitando o cabelo de lado e me lembrando da feição da adolescência, do rosto dos anos de faculdade. Uma luz se acende. Sacudo a mochila procurando o objeto perdido no tempo. Seguro firme e trago a frente do espelho. Contorno os meus lábios e vou trazendo-os a vida. Saio do banheiro, olhando para o meu reflexo nos vidros que eu encontro. Olho para o banco onde há pouco estivera sentada e distribuo sorrisos para o menino que agora quase cochila, para a mulher que o tem ao lado e para o homem do café. A mulher ao telefone também me olha. Eles me sorriem de volta e eu aceno a mão confiante e sigo o meu caminho. O batom vermelho me salvou! 

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