segunda-feira, 20 de abril de 2020

Eu ouvi muitas vezes de vovô Minervino, a história de como ele conheceu vovó Anália. Me lembro que na maioria das vezes, ele contava na presença dela, olhando repetidas vezes para o seu rosto, buscando talvez aprovação pela lembrança, ou lhe arrancar algum tipo de afeto, ou mostrar que a memória de quando a viu pela primeira vez, nunca o abandonara. E eu achava lindo a forma como ela apenas sorria e dizia: ai, ai. Aliás, esse "ai, ai"da minha avó, tinha uma sonoridade e um significado que só nós, que passamos um longo tempo ao seu redor, sabemos o que representava, mas não sabemos explicar. O meu avô olhava para a sua Anália e dizia que a primeira vez em que a viu, ela morava na rua Primeiro de Janeiro, com Antonio Matias, meu bisavô e a sua companheira, Zulmira, que era a madrasta da minha avó. E ele contava que ele, menino que morava na roça, vinha às vezes até a "cidade" para fazer compras. Que estava esperando alguém próximo a residência do meu bisavô (não sei se a pessoa entrou no mesmo lugar). De repente avista aquela menina, com a vassoura na mão, varrendo o corredor da casa, com a porta aberta. Segundo vovô, ela era tão magrinha, que parecia que ia se partir ao meio. E que ela e a vassoura pareciam algum tipo de parceiras, ambas de igual forma, fininhas. Minervino então achou aquela moça de vestido estampado, bailando com a vassoura entre os braços, "uma coisa linda"! E ficou do lado de fora olhando hipnotizado prá sua ninfa. Ela então passou a sorrir alto. Ele descrevia isso, imitando os sons: kkkkkkkkk, kkkkkkkkkkk. E Zulmira, a madrasta da minha avó, gritava lá de dentro: varre essa casa, Anália! Anália olhava pro moço e o moço devolvia o olhar prá Anália. E ela valsava com a vassoura, varrendo o mesmo lugar, para não perder o ponto exato da vista e do olhar. E Zulmira repetitiva: varre essa casa Anália!. Anália, olho fixo no moço que a fitava, em sintonia, vassoura indo e vindo: kkkkkkkkk, kkkkkkkkk. Ele concluía dizendo que foi embora sem nunca mais ter se apartado daquela lembrança, da moça bonita gargalhando com a vassoura, sem desviar os olhos dos seus.
Só passado algum tempo, Antonio Matias, meu bisavô, levou a sua loja de tecidos para ser instalada na Canabrava, o mesmo lugar onde vovô Minervino morava. E foi à partir daí, que a moça do gargalhar alto, do vestido florido e do corpo esguio, passou a ganhar um novo formato em seu cotidiano.


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