domingo, 20 de outubro de 2019

Da infância a vida adulta, eu atravessei os anos ouvindo os dedos do meu avô martelando as teclas da máquina de escrever. Me lembro de uma cena, em que a minha bisavó, ao final da vida, lá pelas dez horas da noite, gritava do quarto ao lado do escritório: Minervino, para de trabalhar, que trabalho só acaba a gente! Depois tudo acaba... Agora eu vejo a máquina assim,silenciosa, sobre uma peça da sala, sem papel, sem fita, sem o barulho das teclas produzindo petições, histórias, conflitos, gente reclamando pedaços de terra, casais negando a vida em comum, filhos apontando direitos... 
Eu a vejo assim, vazia, ao mesmo tempo em que observo o meu avô dormindo tranquilamente, numa manhã de domingo, quase sem nenhum barulho. E me ocorre que um dia ele também será esse silêncio. Numa tentativa desesperada de trazê-la a vida, eu lanço os meus dedos sobre as teclas. 
Em vão...

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